Topo

Conheça a história do mineiro que virou jogador por causa de uma leitoa

André Astorga é zagueiro da Portuguesa - Reprodução/Facebook
André Astorga é zagueiro da Portuguesa Imagem: Reprodução/Facebook

Luís Augusto Simon

Do UOL, em São Paulo

23/10/2014 06h00

André Astorga conversa muito com seus companheiros de Portuguesa. Com muita experiência, diz que sempre é possível superar obstáculos, mesmo que pareçam intransponíveis como os atuais. E busca exemplos em sua própria vida. Na ajuda que teve dos pais e de Nina. Nina, a leitoa.

Leitoa de estimação, criada na área da casa, amada pela mãe, Stela. “Ih, ela chorou muito quando o pai resolveu fazer uma rifa e vender a Nina. Pergunta se tá chorando agora que tem casa para morar”, diz André.

Mas o que tem a ver a venda de Nina com a melhoria de vida da família Izepon? André, com um sotaque fortíssimo, explica, entre risos e poucas lágrimas, disfarçadas.

“Meu pai trabalhava em Araguari, em Minas e queria que eu treinasse na cidade. Eu trabalhava no cafezal de manhã e de tarde caminhava 22 quilômetros para treinar. Era tão duro que eu escondia no meio dos pés de café para não ir. Aí, ele me procurava e fazia eu ir”, lembra André.

A volta era com a perua dos estudantes. Para evitar tanto desgaste, que minava o futuro do garoto, o pai se desfez de Nina. Com o dinheiro da rifa, pôde ter uma chuteira nova e pagar o ônibus que o levaria ao treino.

No ano seguinte, 2000, a vida melhorou. O pai deixou Minas e voltou ao Paraná. Comprou um bar (“bar nada, era um botequinho de nada”)  na cidade de Astorga – daí vem o apelido – e passou a jogar futebol diariamente.

Destacou-se nos Jogos Abertos e foi jogar no Coritiba. “Cheguei lá com esperança mas também com vergonha. Todo mundo tinha chuteira bonita e tênis de marca. Não tinha nada. Minha apresentação foi com tênis Pony, calça larga, cintão, camisa xadrez e minha chuteira dentro de um saquinho vazio de açúcar. Nem mochila, eu tinha. Era ‘simplão’ demais”.

Seis meses depois, disputou a Copa São Paulo, pelo Roma Barueri. “A final foi 4 a 4 contra o São Paulo e fomos campeões nos pênaltis. Eu fiz um”.

E lá foi André conhecer a Alemanha. “O Hannover me contratou. Nem sabia falar direito e fui ganhar 30 mil euros por mês. Fiz minha vida nesses tempos de Europa”

Foram quatro anos na Alemanha, com direito a um retorno ao Brasil, em 2003, para ser terceiro colocado no Paulistão, pela Portuguesa Santista. “A  adaptação era ruim lá e eu voltei, mas logo vi que o caminho era na Europa mesmo.”

Foram quatro anos em Hannover e no Rot-Weiss Oberhausen. E dois na Romênia, defendendo o Cluj. Astorga fala alemão, inglês e romeno fluentemente, garante.  O inglês, veio através de um professor especial. “O Caio Ribeiro jogou comigo e me ensinou. Ele é um cara muito legal”.
Astorga se orgulha de seu patrimônio – tem casas em Bragança Paulista, Santos, Maringá e Santa Fé – e de como lutou para conquistá-lo. Por isso, se define como um pão duro de marca maior. “Eu dou tchau com a mão fechada. Conto meus tostões.”

O carro é um PT Cruiser Chrysler, de 2009. E ele não pesa em trocar. “Não chove lá dentro, pra que trocar? Além do futebol, Astorga tem uma empresa que organiza festas de formatura e também constrói casas para revender. “Eu me garanto por todos os lados porque a vida foi dura”.
André ainda acredita na salvação da Portuguesa, apesar de a lógica mostrar a impossibilidade do sonho se concretizar. Caso não dê, gostaria de continuar, mesmo na Serie C. “É um clube grande, querido, quero faze o bem aqui, não quero sair mal”.

Com 32 anos, pretende jogar até os 39. “Eu me cuido muito, não tenho problemas físicos e dá para jogar bem até os 39”. Mas por que só 39? Por que não até os 40? “Quarenta, não. Dá a impressão de ser velho. É igual loja de R$ 1,99, o pessoal compra porque pensa que é barato. Se for dois reais, acha caro. Com 39, você é experiente. Com 40, é velho. Então, eu saio antes”. E 2022 verá, então, o fim da carreira de André Astorga, caipira e poliglota, iniciada com o sacrifício da amiga Nina, a leitoa.