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Dois filhos de Vitor: as loucuras e os sacrifícios do pai de Ricardo Goulart

Ex-jogador de futebol, Vitor Gomes Pereira relembra histórias do início da carreira
do artilheiro do Brasileirão e do meia Juninho, que atua pelo Los Angeles Galaxy

Por São José dos Campos, SP

Vitor Gomes Pereira pai Ricardo Goulart (Foto: Danilo Sardinha/GloboEsporte.com)Vitor Gomes Pereira é pai de Ricardo Goulart, do Cruzeiro, e Juninho, do Los Angeles Galaxy (Foto: Danilo Sardinha)

"No dia em que eu saí de casa, minha mãe me disse: 'Filho, vem cá'...".  Foi no embalo desta trilha sonora que o Brasil conheceu, em 2005, a história de Francisco Camargo, pai da dupla sertaneja Zezé Di Camargo e Luciano. No filme "2 Filhos de Francisco", dirigido por Breno Silveira, o esforço do humilde lavrador para ver os filhos brilharem na música conquistou o país e virou sucesso nas bilheterias do cinema. Enquanto o longa-metragem despontava nas telonas, o mecânico Vitor Gomes Pereira construía em São José dos Campos, interior de São Paulo, um roteiro semelhante com os filhos Ricardo Goulart Pereira e Vitor Gomes Pereira Júnior, o Juninho.

Confiante no potencial dos garotos para o futebol, Vitor Gomes os imaginava como jogadores no futuro. A experiência que tinha como atleta do São José Esporte Clube (SP) nos anos de 1980 foi usada para ajudar na realização do sonho dos filhos, que, com o tempo, passou a ser dele também. Motivado por esse ideal, o mecânico natural de Paraibuna, interior paulista, não poupou esforços para atingir a meta. Em determinados momentos, chegou a ser tachado de "louco" ou "sonhador". Mas assim como Francisco Camargo, não deu a mínima. As "loucuras" que fez no passado hoje foram recompensadas.

Juninho, filho mais velho, é um dos principais atletas do Los Angeles Galaxy, dos Estados Unidos, onde se tornou "sucessor" de David Beckham. E Ricardo Goulart, o mais novo, é artilheiro do Campeonato Brasileiro e foi convocado nesta terça-feira para a seleção brasileira.

– Sacrifiquei-me muito por eles. Não tive vida pelos dois moleques. Quando começaram a ter o dom, abdiquei de muita coisa. Na minha vida particular, por exemplo: sou o caçula de 11 irmãos. Quando juntavam todos para fazer um churrasco, eu não estava. Isso porque estava correndo com eles, lutando pelo sonho deles. Agora, vendo que o sonho deles se realizou, fico muito contente. Quando vejo o Juninho e o Ricardo nesse momento, penso: “Agora, o que Deus me der, está bom” – contou Vitor Gomes.

Vitor Gomes Pereira pai Ricardo Goulart (Foto: Danilo Sardinha/GloboEsporte.com)As camisas de Ricardo Goulart e Juninho são expostas pelo pai com orgulho (Foto: Danilo Sardinha/GloboEsporte.com)











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pai e treinador


Vitor Gomes foi o primeiro fã que Ricardo Goulart e Juninho tiveram. Desde quando eram crianças, já eram vistos pelo pai como dois potenciais jogadores no futuro. Por isso, foram estimulados a treinarem o esporte. Além de mecânico, Vitor trabalhava como técnico da escolinha de futebol Moreira Sport's, que revelou atletas como Casemiro (atualmente no Porto, de Portugal). No local, colocou os filhos para treinar.

Tranças Ricardo Goulart Moreira (Foto: Reprodução)Ricardo Goulart, o quarto agachado da esquerda para direita, com time em São José (Foto: Reprodução)

– A minha mulher falava que eles estavam faltando na escola. Eu falava: “Vamos atrás do sonho deles. Qual é o sonho deles? É jogar bola, não é? Então, vamos atrás do sonho deles. Você toma conta da menina e deixa eles comigo”. Ninguém acreditava no meu sonho para eles. Meu sonho era muito grande para os dois. Eu os imaginava como jogadores de futebol. Ninguém tirava isso de mim – relembrou Vitor Gomes, que é primo do ex-zagueiro Marião, que, dentre outros clubes, defendeu o São Paulo e o Internacional.

Teimoso para realizar o sonho, o mecânico treinou os dois filhos na infância. Segundo ele, o caminho de Juninho foi mais fácil. Quando tinha 14 anos, o garoto ganhou a oportunidade de fazer um teste no São Paulo. Para se preparar, contou a ajuda do pai.

– Treinei ele em frente de casa. Acordava de manhã e pegava eles. O pessoal passava na rua e pensava: “Esse cara está louco. Treinando esses dois moleques”. O pessoal me chamava de louco. Ninguém deu muita atenção. Aí o Juninho, duas semanas depois, foi fazer um teste São Paulo. Foi bem e ficou lá. Ficou nove anos no São Paulo e, depois, foi para os Estados Unidos – disse Gomes.

Juninho comemoração Los Angeles Galaxy (Foto: Divulgação/ Los Angeles Galaxy)Juninho hoje é um dos destaques do Los Angeles Galaxy (Foto: Divulgação/ Los Angeles Galaxy)

Com Goulart, porém, o pai recorda que o caminho para o filho conseguir crescer no futebol foi mais demorado. Assim como fez com Juninho, Vitor Gomes incentivou Ricardo a fazer testes em grandes equipes. No entanto, o meio-campista não conseguia passar nas "peneiras". Em uma delas, no São Paulo, chegou a ser preterido pelo então "atacante" Casemiro, também natural de São José dos Campos.

Nesse começo difícil, Ricardo Goulart passou pela escolinha Moreira Sport's e pelas categorias de base do São Caetano, Taubaté e Santo André, onde se profissionalizou. Depois, defendeu o Internacional, o Goiás e o Cruzeiro.

– Ele (Ricardo) era bom, mas o pessoal não reconhecia o talento dele. Ele ia em um lugar, ficava um tempo e depois saia. Chegou a ficar desanimado com o futebol um tempo. Para o Ricardo chegar hoje à Seleção, foi por insistência dele e minha. O Juninho passou de primeira (no teste no São Paulo). Ele ia e não passava. Ficou duas semanas e não passou. Era meio inseguro. Hoje, ele é mais confiante – contou.

Casemiro e Ricardo Goulart Moreira (Foto: Reprodução)Ricardo Goulart, o terceiro da esquerda para direita, em teste no São Paulo ao lado de Casemiro (Foto: Reprodução)











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suando a camisa pelos filhos


As mãos grossas, com um pouco de graxa na ponta das unhas, são mostradas por Vitor Gomes para representar o sacrifício que diz ter feito para criar os filhos. Após encerrar a curta carreira como atleta profissional do São José Esporte Clube, virou mecânico de manutenção em uma fábrica para cuidar da família. O salário que recebia com a profissão que mantém até hoje servia tanto para o sustento do lar, como para bancar a realização do sonho dos filhos.

O custo, porém, era alto. Vitor Gomes precisou contar com a ajuda de familiares e amigos para conseguir manter vivo o desejo dos garotos.

– É caro para manter dois jogadores. Eu trabalhava noite e dia. Fazia hora extra direto. Varava as noites por eles. Foi uma vitória minha. Vi o talento deles. Sacrifiquei minha vida inteira por eles. Perdi algumas coisas importantes no momento. Mas, no final, sabia que eles iriam chegar a um lugar. Graças a Deus, vejo que essa perda minha valeu a pena – afirmou.

Ricardo Goulart comemoração jogo Cruzeiro e Figueirense (Foto: Douglas Magno / Agência Estado)Ver o sucesso de Ricardo Goulart e Juninho é a recompensa para Vitor Gomes (Foto: Douglas Magno / Agência Estado)











Ainda que o sonho não tivesse se realizado nos campos, mas em outra área, a alegria do pai seria a mesma.

– A vontade deles foi mais importante para eu me sacrificar. Por mim, se eles fossem bancários ou outra coisa, desde que fosse algo de bem, eu estaria realizado. Mas vi que todo dia eles queriam mais. Eu alimentava o sonho e pensava: “Não posso tirar esse sonho deles. Deixa eu me sacrificar, mas eles vão ter o que querem". Isso é uma recompensa para mim, para a família e para os amigos, que sempre nos apoiaram – ressaltou Vitor Gomes.

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esforço reconhecido

As "loucuras" e o sacrifícios de Vitor Gomes rendem hoje no filho, Ricardo Goulart, o sentimento de gratidão. Feliz com o bom momento da carreira, o jogador de 23 anos reconhece a importância do pai para as conquistas no esporte.

– A relação com meu pai sempre foi boa e é até hoje. Ele sempre me apoiou a jogar bola, ia aos jogos e sempre que podia estava ali à beira do campo. Ele tem uma grande parcela em tudo que está acontecendo comigo hoje e o agradeço muito – destacou o atleta.

Juninho e Ricardo Goulart Los Angeles Galaxy (Foto: Reprodução/ Twitter)Ricardo Goulart sonha em reeditar parceria com o irmão mais velho (Foto: Reprodução/ Twitter)

Em São José dos Campos, a relação entre pai e filhos era constante. Hoje, a vida levou cada um para um lado. O convívio já não é mais tão frequente. Mas, sempre que podem, procuram se encontrar. Em fim de ano, por exemplo, é tradição na família organizar uma partida de futebol entre os parentes.

Apesar da distância, Ricardo Goulart mantém com o irmão, Juninho, uma boa convivência. Mesmo com dois anos de diferença, jogaram juntos na escolinha Moreira Sport's. A parceria antiga, que o futebol tratou de separar com o tempo, ele torce para que o próprio futebol traga de volta.

– Sempre tive uma relação boa com meu irmão, mas hoje ele está seguindo a carreira dele nos EUA e eu aqui, o que nos deixa um pouco distantes. Quando criança jogávamos juntos, disputando campeonatos e espero que ainda possamos jogar juntos. Quando temos oportunidade e as férias batem, encontramos e é sempre legal – comentou.


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